m'espanto às vezes, outras m'avergonho
Post date: Jan 7, 2010 1:24:40 AM
Escrevia Sá de Miranda (a): “m'espanto às vezes, outras m'avergonho” a propósito da “senhora, em vós os olhos ponho”, e que Pacheco Pereira utiliza como lema do seu blogue “Abrupto”. Pois apetece-me usar este mesmo lema relativamente a alguns acontecimentos que por aqui vão ocorrendo, ainda que cada vez “m´avergonhe” mais do que “m´espante”.
Desde que vi, na minha terra, reincarnações (ou serão fantasmas?) da Madame de Pompadour e da Duquesa de Mântua, estou de tal maneira causticado que não me espantaria se visse um porco a andar de bicicleta ou qualquer outro acto ou facto insólito.
(a) -Soneto
Quando eu, senhora, em vós os olhos ponho,
e vejo o que não vi nunca, nem cri
que houvesse cá, recolhe-se a alma a si,
e vou tresvaliando, como em sonho.
Isto passado, quando me desponho,
e me quero afirmar se foi assi,
pasmado e duvidoso do que vi,
m'espanto às vezes, outras m'avergonho.
Que tomando ante vós, senhora, tal,
quando m'era mister tant'outr'ajuda,
de que me valerei, se alma não val?
Esperando por ela que me acuda,
e não me acode, e está cuidando em al,
afronta o coração, a língua é muda.
Sá de Miranda
DOCUMENTOS PREVISIONAIS - 2010-01-05
Auto-remetido à condição de simples cidadão independente e de simples e humilde munícipe, auto-afastado que estou das lides partidárias, não podendo por isso ser acusado de ser um estorvo e uma “espinha na garganta” de ninguém, vou acompanhando a vida política local como posso, uma vez que no Sardoal não há espaço para o debate político e para a participação cívica, aberto à participação dos cidadãos interessados e, muito menos, informação municipal que permita uma análise da gestão municipal, nas suas mais diversas componentes.
Quando procurei no site www.cm-sardoal.pt, informação sobre os documentos previsionais do Município de Sardoal para o ano económico de 2010, a única informação que consegui encontrar foi a que transcrevo a seguir, com sublinhado a vermelho:
“Os grandes vectores estratégicos da Autarquia passam pelas candidaturas, no âmbito do QREN, com especial incidência na valorização urbana do centro histórico da Vila, Assembleia Municipal de Sardoal aprovou orçamento para 2010
A Assembleia Municipal de Sardoal, em edital próprio, anunciou a aprovação das Grandes Opções do Plano, do Plano Plurianual de Investimentos e do Orçamento para 2010, orçando este último em 10.476,00€. (Este valor não está errado? Não serão dez milhões, quatrocentos e setenta e seis mil euros, com mais alguns euros e cêntimos?)
Reabilitação da rede de abastecimento de água e construção ou requalificação de espaços desportivos (campo de ténis, parque desportivo municipal e pavilhão gimnodesportivo da Escola Dra. Maria Judite Serrão Andrade).”
É muito pouco, para não dizer que não é nada!
A partir destes elementos não é possível chegar a qualquer conclusão sobre a validade daqueles documentos, nem perceber qual é a estratégia de desenvolvimento que se encontra (?) delineada para os próximos quatro anos, se é que existe alguma estratégia…
Chamo a atenção a quem de direito sobre o que se encontra estabelecido na Lei das Finanças Locais, acerca da informação que deve ser, obrigatoriamente, disponibilizada aos munícipes, em matéria financeira.
Para quem não conheça a legislação aplicável, tomo a liberdade de transcrever dois dos artigos aplicáveis.
Comparem o que se encontra regulamentado com o conteúdo do site municipal…
Lei n.º 2/2007 de 15 de Janeiro
Aprova a Lei das Finanças Locais, revogando a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto
Artigo 4.º
Princípios e regras orçamentais
1 - Os municípios e as freguesias estão sujeitos às normas consagradas na Lei de Enquadramento Orçamental e aos princípios e regras orçamentais e de estabilidade orçamental.
2 - O princípio da não consignação não se aplica às receitas provenientes de fundos comunitários e do fundo social municipal, previsto nos artigos 24.º e 28.º, às receitas dos preços referidos no n.º 3 do artigo 16.º, às receitas provenientes dos empréstimos a médio e longo prazos para aplicação em investimentos, bem como às provenientes da cooperação técnica e financeira e outras previstas na lei.
3 - O princípio da equidade intergeracional, relativo à distribuição de benefícios e custos entre gerações, implica a apreciação nesse plano da incidência orçamental:
a) Das medidas e acções incluídas no plano plurianual de investimentos;
b) Do investimento em capacitação humana co-financiado pela autarquia local;
c) Dos encargos com os passivos financeiros da autarquia local;
d) Das necessidades de financiamento do sector empresarial local, bem como das associações de municípios;
e) Dos encargos vencidos e não liquidados a fornecedores;
f) Dos encargos explícitos e implícitos em parcerias público-privadas, concessões e demais compromissos financeiros de carácter plurianual.
4 - Os municípios e as freguesias estão também sujeitos, na aprovação e execução dos seus orçamentos, aos princípios da estabilidade orçamental, da solidariedade recíproca entre níveis de administração e da transparência orçamental.
5 - O princípio da transparência orçamental traduz-se na existência de um dever de informação mútuo entre o Estado e as autarquias locais, como garantia da estabilidade orçamental e da solidariedade recíproca, bem como no dever de estas prestarem aos cidadãos, de forma acessível e rigorosa, informação sobre a sua situação financeira.
6 - O princípio da transparência na aprovação e execução dos orçamentos dos municípios e das freguesias aplica-se igualmente à informação financeira respeitante às associações de municípios ou de freguesias, bem como às entidades que integram o sector empresarial local, concessões municipais e parcerias público-privadas.
Artigo 49.º
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1 - Os municípios devem disponibilizar, quer em formato papel em local visível nos edifícios da câmara municipal e da assembleia municipal quer no respectivo sítio na Internet:
a) Os mapas resumo das despesas segundo as classificações económica e funcional e das receitas segundo a classificação económica;
b) Os valores em vigor relativos às taxas do IMI e de derrama sobre o IRC;
c) A percentagem da participação variável no IRS, nos termos do artigo 20.º;
d) Os tarifários de água, saneamento e resíduos quer o prestador do serviço seja o município, um serviço municipalizado, uma empresa municipal, intermunicipal, concessionária ou um parceiro privado no âmbito de uma parceria público-privada;
e) Os regulamentos de taxas municipais;
f) O montante total das dívidas desagregado por rubricas e individualizando os empréstimos bancários.
2 - As autarquias locais, as respectivas associações e as entidades do sector empresarial local devem disponibilizar no respectivo sítio na Internet os documentos previsionais e de prestação de contas referidos na presente lei, nomeadamente:
a) Os planos de actividades e os relatórios de actividades dos últimos dois anos;
b) Os planos plurianuais de investimentos e os orçamentos, bem como os relatórios de gestão, os balanços e a demonstração de resultados, inclusivamente os consolidados, os mapas de execução orçamental e os anexos às demonstrações financeiras, dos últimos dois anos;
c) Os dados relativos à execução anual dos planos plurianuais.
Ainda que possa não ser um imperativo legal, não seria curial que os documentos previsionais para o ano económico de 2010 estivessem já disponíveis, para consulta, no site municipal, uma vez que já estão aprovados pela Câmara Municipal e pela Assembleia Municipal?
Na minha modesta opinião, numa lógica de incentivo à participação cívica dos cidadãos, justificava-se que documentos daquele tipo ficassem disponíveis para consulta pelos cidadãos, logo na sua fase de discussão, criando-se um espaço aberto à recolha de ideias e de sugestões, como contributos para a sua eficácia futura.