13. Notícias de há 100 anos (III)
JORNAL DE ABRANTES
10 de Abril de 1910
Correspondência do Sardoal
Não duvidem.
Com verdadeiro orgulho, caros leitores, cumprimos o dever de saber bem longe que a nossa câmara, é senhora e autora de maravilhosos inventos, sistemas deliberativos que têm causado assombro, ás suas colegas de Venda Nova, Entrevinhas e Palhota!...
Ele, cumprindo rigorosamente o seu código de...posturas, único lugar onde se rege, reúne às segundas-feiras sob a presidência do homem de estatura mediana, do seu amo Victor, que, introduzindo-se na sala das sessões, munido do seu clarinete e seu colega gaguejante com a sua rabeca entre unhas e restantes vereadores com os seus timbales produzem, nas gaitas, tais sons que obrigam os munícipes envergonhados à debandada deixando-nos assim a sós.
A câmara reúne às segundas-feiras para quê?... Para sabermos pelos seus resumos que deferem o requerimento do Xico, para mudar um regato, o do João para construir uma casa, o Dr. Manuel para mandar o Zé pôr o caminho no seu antigo estado, e do seu amo Victor para poder fazer arrumação de pedra em forma de parede, a fim de lhe permitir ampliar à sementeira das batatas!
No seu resumo de 14 do mês findo lá vem coisa parecida a que antecede, o que tudo assim serve para iludir, com a tal música, o Zé pagante que não sabe ler salvo honrosas excepções para desviar verbas que deviam ser aplicadas em obras úteis tais como o empedramento do ramal dos Valhascos, etc.
Ainda no resumo acima referido se nota que foi deliberado o concerto das caçadas estragadas, com assento como o da luz e acetileno, quando é certo e sabido que tal estrago era necessário, se ao Zimbório do senhor gaguejante e companhia não subisse a ideia do grande invento de ser inutilizada em parte da modesta luz do petróleo para ser substituída também em parte, pela luz de acetileno que, apenas 15 bicos custaram ao município acerca de 15$00 réis, cuja quantia bem administrada, faria novas calçadas e uma boa reparação nas velhas, facultando-nos maravilhoso trânsito e evitando que, mesmo com luz de petróleo, déssemos os nossos trambolhões, visto que a calçada em toda a vila, estão em estado desagradável.
No supra dito resumo também se lê que vai ser adquirida canalização para conduzir as águas às portas para os contadores. Uma inocente interrogação? Onde foram empregados os canos requisitados pela câmara pelo mês de Outubro do ano passado, destinados segundo rezava a respectiva deliberação, sobre o mesmo fim que custaram os 100$00 réis, que ainda restavam de uns célebres 2.500$00 réis.
Se esses catões nos respondessem dávamos-lhe um doce!
Partiram para Coimbra os Exmºs Srs. Dr. Eusébio Tamagnini, Dr. Armando Serrão Mora, Padre Luis Andrade e Silva, Manuel Serras Pereira e David Serras Pereira, Álvaro, João e Manuel Andrade e Silva.
Retiraram também o Exmº Sr. Dr. Anacleto Matos Silva para Santarém, António Augusto de Campos para Penacova, Manuel Pires para Pedreira (Tomar), João José Pereira de Matos para o Porto, António Pereira de Matos para Lisboa e para Portalegre António Lopes. A todos muita saudade e prosperidades.
Abril de 1910
Zaguncho Júnior
JORNAL DE ABRANTES
17 de Abril de 1910
Correspondências de Sardoal
Recordam-se os nossos leitores do que escrevemos na nossa primeira e seguintes correspondências acerca dos processos usados por esta câmara, para executar os serviços que até hoje ainda não classificou de nenhum valor.
Foi justamente nessa primeira correspondência que evidenciamos quanto está mal administrado os dinheiros do município que devia ser aplicado em obras úteis, tais como reparação e conservação das estradas municipais de Valongo, Cabeça das Mós e dos Valhascos.
Bem sabemos que é de bradar no deserto, embora a honra do tremendo ajuste de contas esteja próximo, mas cumprindo a nossa exígua mas leal missão, registamos aqui o nosso processo para que bem longe se saiba que no passado se gastou 500$00 réis com um gasómetro que fornece 3 horas de luz a 17 bicos, mas temos uns caminhos e estradas em deplorável estado!...
Foi submetido à aprovação superior o orçamento suplementar ao ordinário corrente, balanceado em 500$00 réis destinados à reparação dos caminhos vicinais como já é de conhecimento público do concelho.
Realizou-se no pretérito domingo a festividade ao Senhor dos Remédios com bastante brilho e concorrência de forasteiros vindos de bastante longe.
O fogo feito pelo pirotécnico José Lourenço Galinha, dos Valhascos, agradou bastante com a especialidade de foguetes a cores.
Por último quando todos se retiravam para suas casas, o Sr. administrador do concelho tocou a rebate no costado do Bentinho sacristão da freguesia, mandando-o em seguida para a cadeia a fim de ali orar por todos santos e santas da corte do Céu!
Abril de 1910
Zaguncho Júnior
Pelo Sardoal
No passado dia 10 do corrente teve lugar nesta vila a tradicional festa do Senhor dos Remédios, que é levada a efeito pela Santa Casa da Misericórdia e que constou de festa da Igreja, arraial, fogo, iluminação, estando exposto ao público o hospital da mesma Santa Casa, que estava num asseio extraordinário.
Por estar um belo dia de sol e haver mercado mensal, houve uma enorme concorrência de forasteiros especialmente de Abrantes.
Cerca das 10 horas da noite quando a animação era maior, ouvimos o Sr. Administrador do concelho dirigir-se a Narciso Barroca que se encontrava no arraial e após uma leve troca de palavras, lançou-se aos murros ao pobre homem, que tem sido sempre bem comportado, num estado de hesitação terrível como um possesso, continuou batendo até que o entregou a um polícia e o levou para a cadeia.
A iniquidade do administrador a todos indignou, mas essa indignação elevou-se quando passados momentos, sua Exª. num estado se é possível mais excitado consequência inevitável de certos abusos, dentro do Edifício da Santa Casa, onde tinha todos cabos de polícia formados, atirou-se também ao sacristão da mesma Santa Casa, e levou-o aos socos pelos claustros dentro, sem respeito algum pelo lugar onde se encontrava, sem acatamento e delicadeza para com as senhoras e as crianças que estavam no recinto e onde deu largas aos seus despóticos abusos, chegando no meio da sua euforia a magoar algumas senhoras.
Estas arbitrariedades exaltaram os espíritos o que é de lamentar certamente e justo esforço de um povo que trabalha e sente, que reconhece a sua emancipação do despótico tempo dos calceteiros se não fosse a prudente intervenção de algumas pessoas.
A mesa da Santa Casa da Misericórdia, na sua primeira sessão vai tratar do assunto para protestar e ilibar responsabilidades destes factos.
JORNAL DE ABRANTES
1 de Maio de 1910
Festas do Espirito Santo
Dias 12, 13, 14 e 15 de Maio
Segundo informação vamos ter festa rija este ano.
A comissão dos festejos tem à sua frente um rapaz patriota, amigo da sua terra, Abílio da Fonseca Matos Silva, que não se poupou a sacrifícios de toda a espécie que esta festa acarreta, e de resto toda a comissão que é composta de homens trabalhadores que capricham em imprimir à festa o maior esplendor e brilho.
A festa constará pouco mais ou menos do seguinte:
Dia 12,chegada das reses pelas 5 horas da tarde.
Dia 13, matança de 6 ou 7 rezes pelas 5 horas da manhã, seguindo-se a distribuição das rações aos mordomos que concorrem com a sua esmola para a festa, segundo o tradicional uso e costume. Durante o dia, condução do pão por duas grandes alas de raparigas vestidas de branco, para a capela do Santo, acompanhadas da tradicional gaita-de-foles.
Dia 14, bodo geral pelas 9 horas da manhã, música e arraial e abertura de uma quermesse caprichosamente levada a efeito por uma distinta comissão de senhoras composta de D. Maria Judite Leal de Matos e Silva, D. Maria Clementina Caldeira Serrão Leal e D. Maria Ignez Pequito Caldeira Serrão.
Dia 15 arraial, música, quermesse e diversas diversões, tais como cavalhadas, corridas de resistência de bicicletas, se houver inscrições de corredores, sendo-lhes oferecidos 2 prémios de corridas de sacos etc. À noite iluminação e talvez fogo de artifício.
Dia 16, Festa da Igreja a grande instrumental pela orquestra Sardoalense, reunião, procissão, na qual se faz a apresentação da nova comissão para o futuro ano, arraial, música, quermesse e à noite iluminação.
São estes os detalhes à última hora que nos informaram do que constarão os festejos, pois que o programa definitivo da festa ainda não está organizado, devendo por estes dias ser publicado nos jornais.
Lembra-nos o quanto seria agradável porque sabemos também ser em grande número, que a Junta da Paróquia tenha aberto ao público a famosa Igreja Matriz, que conceda licença a qualquer pessoa que queira ir à varanda da Torre ver o soberbo panorama que dali se desfruta.
A mesa da Santa Casa da Misericórdia, abriu o hospital e duas dependências ao público, assim como a antiquíssima Igreja da Misericórdia.
A Câmara Municipal, o depósito das águas e o cemitério.
Da mesma forma que ela fizesse aformosear as ruas da vila, mandando desobstruir todas as pedras, ervas, etc. que nelas se encontram.
Aplicar desde já os artigos do código de postura n.º 6 para a prática do qual, mas só para os pobres como tal reconhecidos, um anónimo oferece à sua parte 30 arrobas de cal branca, cuja oferta será administrada por pessoa, por esse anónimo encarregada:
Aplicação dos artigos 33-45-48.
O 45, proibindo mais a proibição de certas vendas se façam dentro de carroças, o 48, abrangendo mais o dia 15, dia talvez de maior concorrência dos festejos não devendo por isso dentro da artéria da vila no local dos festejos, admitir-se a passagem constante de carros e cavalgaduras.
Mais lembramos a aplicação, de melhor água, sabão e pano nos vidros dos candeeiros da iluminação pública.
Ao Sr. Administrador lembramos do policiamento ordeiro e rigoroso durante os 4 dias de festa.
O Sardoal pode e deve fazer uma festa à altura, proporcionando aos seus visitantes a passagem de algumas horas aprazíveis, muito especialmente este ano que consta com bons recursos.
A Empresa Gualter, de Abrantes, faz carreiras. Quem queira pode também tomar o ramal dos Beirins, pois que já liga com a estrada 122 e por conseguinte com o Sardoal.
Nesta vila encontrarão também os Srs. forasteiros duas casas de hóspedes com bom serviço.